Guerra deve agravar risco de fome no mundo

Oficial de sistemas alimentares da FAO diz que crises sanitária, militar e humanitária se cruzam no conflito

Guerra deve agravar risco de fome no mundo

A Guerra entre Rússia e Ucrânia tem efeitos que vão muito além de suas fronteiras e um deles está relacionado ao aumento da insegurança alimentar no mundo. O conflito, que acontece na sequência das dificuldades impostas pela pandemia, pode agravar ainda mais o risco de fome.

“O que nós estamos monitorando em um primeiro momento é o impacto nos preços [dos alimentos]. Nós já vivemos uma elevação dos preços decorrentes da pandemia de covid-19, não é um fenômeno brasileiro é um fenômeno que está instalado na maior parte dos países, e isso diz respeito às situações de logística, de estrutura de armazenagem e também sobre a diminuição do poder de compra das pessoas, a pandemia afetou dramaticamente a capacidade de compra de milhões de pessoas. Então, tanto na oferta quanto na demanda, a gente vê problemas graves por conta da pandemia. Agora, por conta do conflito bélico, nós vamos encontrar uma crise sanitária, com uma crise militar e, possivelmente, com uma crise humanitária, principalmente na Europa, nos países que são fronteiriços com a Ucrânia. Veja como essa situação se torna complexa na medida em que três grandes crises passam a se cruzar”, explica João Intini, oficial de sistemas alimentares da Organização para a Alimentação e a Agricultura (FAO) das Nações Unidas, que participou do Planeta Campo direto do escritório da entidade em Santiago, no Chile.

Neste cenário, o oficial ressalta a importância de ações governamentais para garantir a produção e comércio de alimentos. “As medidas precisam ser ainda mais coordenadas, mais criativas e mais enérgicas dos governos para proteger a segurança alimentar das suas populações e para seguir naturalmente com as práticas comerciais, com o comércio internacional de alimentos, onde o Brasil é um player global de altíssima relevância. O Brasil também é importador de insumos, então veja que nesse balanço entre oferta e demanda de alimentos, dentro de cada país e a nível global, já existem efeitos e futuramente poderemos ter outros problemas, a depender de como esses efeitos chegarão aqui”.

João Intini também falou sobre a relevância mundial do setor de alimentos e da dificuldade crescente em alimentar a população global até o fim da década. “Milhares de pessoas, milhões de pessoas estão conectadas ao tema dos alimentos de alguma maneira, desde os produtores, pescadores, extrativistas, até chegar aos restaurantes, aos hotéis, cafeterias. Veja, é uma cadeia enorme que movimenta aproximadamente 3 milhões de pessoas em todo o mundo conectadas ao tema da alimentação. Somente pensando nos que produzem, são mais de um milhão entre produtores e pescadores, além de outros que estão aí na parte primária da produção. E mesmo com toda essa intensidade, todas essas pessoas trabalhando, produzindo diariamente, cotidianamente, neste momento nós já temos no planeta 2 bilhões de pessoas que não se alimentam regularmente, já é assim. Então o sistema alimentar já tem os seus desequilíbrios, e veja que número dramático: em 2030 as Nações Unidas projetam o número de 840 milhões de pessoas com fome no mundo. Então não é simplesmente que não comem adequadamente, estamos falando de pessoas com fome, quase um milhão de pessoas passarão fome em 2030. Então os desequilíbrios que já existem serão ainda mais intensificados por conflitos bélicos como esses que a gente está vendo”, enfatiza.

Outro aspecto importante que deve demandar atenção dos líderes mundiais é a crise humanitária que deve se instalar devido à guerra. “Estamos cada vez mais globalizados, conectados, universalizados, e esse tipo de evento não promove problemas exclusivamente nos países que estão envolvidos. Veja os efeitos nos países que estão nas fronteiras da Ucrânia, já existem mais de 1,5 milhão de refugiados ucranianos na Polônia, na Eslovênia, na Romênia, e isso vai seguir acontecendo como um efeito dramático e um problema humanitário drástico para esses países também, que vão acabar absorvendo os impactos diretos dessa guerra também nos seus territórios. Isso vai chegar ao Brasil, vai chegar a América Latina, vai chegar em toda parte”, diz João Intini.

Confira o programa Planeta Campo com a participação de João Intini, oficial de sistemas alimentares da FAO: