Métricas das emissões de gases de efeito estufa não atendem aos países tropicais

Para combater a insegurança alimentar, é necessário avançar na tropicalização das mensurações dos gases de efeito estufa.

Métricas das emissões de gases de efeito estufa não atendem aos países tropicais

O quarto painel do segundo Fórum Planeta Campo intitulado: ‘Carbono e Metano – o Balanço das Emissões’, colocou em discussão a mensuração das emissões de gases de efeito estufa nas produções tropicais. “Hoje, nós vivemos uma transição que tem como característica básica o compromisso mundial de promover a natureza como sócia da produção; Na base desse compromisso, está a ideia de que o verde tem que valer mais do que o não sustentável”. Com esta declaração, Daniel Vargas, coordenador do Observatório de Bioeconomia da FGV abriu as discussões. 

Natureza como sócia da produção

Segundo o especialista, é necessário precificar as emissões e trazer isso para os modelos de negócios dos países  criando uma rota onde as atividades econômicas mais produtivas sejam também as mais sustentáveis. “O grande desafio é que, para isso, a gente precisa ter clareza sobre o que é verde na discussão climática internacional. Verde não é uma cor, é um critério econômico referenciado cientificamente”, explicou. 

De acordo com Vargas, as atividades produtivas consideradas verdes foram definidas a partir de realidades climáticas e físicas de países não tropicais. Assim, cria um conjunto de tensões que ofuscam os méritos já conquistados na região dos trópicos além de gerar dificuldades para a interação de países destas regiões com o mundo.

Exemplo com o etanol 

No decorrer da palestra, o representante da Fundação Getúlio Vargas citou exemplo presenciado pela academia. “Nós tivemos uma empresa que nos procurou interessada em comprar etanol considerando a necessidade de modificar a fonte de combustível usada na aviação. Ela dialogava com o Brasil, Estados Unidos e Europa. No meio do processo, excluiu o Brasil”, contou. O motivo dessa exclusão seria um parâmetro internacional usado para mensurar o carbono das emissões provenientes da plantação de cana. “Segundo a análise, o plantio de cana era responsável pelo desmatamento da Amazônia, distante 1800 km da região. Isso iria encarecer a produção e tornava a opção brasileira indesejável ou mais cara que a europeia ou americana”, explicou.

O painelista ainda evidenciou o esforço de instituições como a Embrapa para mostrar que não é possível atribuir uma causa ao  que acontece a uma distância tão longa.“O problema é que esse parâmetro não é uma exceção. Ele é usado, dia após dia, em parâmetro de comparação, fora da nossa realidade,  que nos pune sem nos dizer”, afirmou.

Tropicalização das métricas

Para finalizar, Daniel Vargas falou da necessidade de tropicalização dos parâmetros de referência e mensuração para cada produto e cada hectare. Além disso,  sugeriu a criação de um base nacional pública transparente e organizada com a finalidade de orientar e certificar, por meio de um conselho internacional, dados nacionais para orientar políticas publicas adotadas no Brasil. 

O segundo painelista da tarde foi Alexandre Berndt, chefe-geral da Embrapa Pecuária Sudeste. O representante da Embrapa apresentou dados e soluções encontradas pela instituição para mitigar a emissão de metano na produção de proteína animal. Segundo dados do IPCC, Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, de maio deste ano, a contribuição do metano é de 18% nas emissões globais. No que diz respeito às emissões brasileiras, a porcentagem é de 19,3% com base nos dados de 2016.

Para o representante da Embrapa, a intensificação dos sistemas de produção pode reduzir a intensidade das emissões, o que significa  dizer redução de CO2 equivalente por quilos de produtos como carne, leite bezerro e lã através da adoção de tecnologias que melhor se enquadrem no perfil de produção.

Ainda de acordo com Berndt, são três pilares nesta construção:

-Tecnologias que atuam na redução, diluição ou compensação de emissões de carbono atuando diretamente na alimentação dos bovinos como aditivos e ações pastagens .

– Aumento da eficiência na produção através do encurtamento do ciclo de produção;  o melhoramento genético; a nutrição; reprodução; sanidade; bem-estar e gestão.

– Sistemas integrados com grande potencial de retirar carbono especialmente no tronco das árvores inclusive nos sistemas integrados.

 Para finalizar, Alexandre Berndt apresentou um artigo científico internacional afirmando que, se o produtor fizer a adoção de animais melhorados geneticamente e com a utilização de manejos de solos e pastagens adequados  o potencial de redução das emissões será 38%.

Exemplo no Pará

Na sequência, a gerente de sustentabilidade da Agro Santa Bárbara, Juliana Corrêa, apresentou técnicas usadas na propriedade no estado do Pará. A gestora reforçou os benefícios dos sistemas integrados como a integração lavoura pecuária e floresta, o ILPF. Segundo Juliana no Estado a regularização da seca acontece de maio a agosto.  “É uma seca muito acentuada. Assim, é importante para o produtor ter forragem disponível em todo esse período. O produtor que não faz o sistema lavoura- pecuária (LP) no Pará precisa trabalhar com uma taxa de lotação muito menor o ano inteiro; Do contrário, na época da seca acontece o boi sanfona”, disse. 

Ainda de acordo com a gestora, o sistema LP, apesar de ser muito rentável e produtivo, não é um sistema simples. “Tem muitas características técnicas. Quando você olha para esse sistema,  tem que pensar na maneira certa para que depois você não tenha prejuízo na safra seguinte”, afirmou. 

“Com o ILPF temos aumento da produtividade, solo mais saudável, diminuição na pressão por desmatamento, menor emissão de metano pelos animais e maior fixação de carbono no solo e sequestro pelas plantas”, explicou.

Para mediar as discussões, o diretor de sustentabilidade da JBS, Mauricio Bauer, destacou o  Net Zero, um compromisso assumido pela JBS para zerar as emissões líquidas (diretas e indiretas) de gases do efeito estufa até 2040.  De acordo com o executivo, a empresa se comprometeu a estabelecer metas de curto e longo prazo de redução de suas emissões com o SBTi (Science Based Targets Initiative), iniciativa global que ajuda empresas e estabelece metas ambiciosas de redução de emissões alinhadas à ciência mais recente sobre o clima.